sábado, 7 de julho de 2012

Tudo o que eu quis




Era um dia qualquer de verão. Agora, só me lembro de que era verão, porque era a estação que cheirava o cheiro que o sol tinha quando pousava em seus cabelos. Ele era o compêndio das coisas que eu jamais seria. A minha fúria repousada, dormindo em berço quente. Ele era o golpe maior de uma dor lenta e letárgica que eu não me julgava merecedor de sentir. Ele próprio era o verão, com seu cheiro de hortelã-pimenta e estio pela grama. Ele era os becos escuros repletos de vida e anseios, as tardes com pôr do sol magenta, música e sonho diante da cortina estendida de céu e mar. Ele era a própria explosão do universo, o epigênese de tudo, quando carregado a morada de Morfeu em seus sonhos mais ternos, eu, como o homem mais pleno do mundo o embalava e sentia sua respiração trêmula na pele exposta da minha garganta. Ele era a ambição da chuva de lavar os corpos. Ele tinha gosto de morango, saliva, orvalho e dúvida. Ele era a prova de que eu era a pessoa mais repleta de erros que pudera existir. Mas eu tapara os buracos dos meus defeitos com a sua existência. E essa presença era o álibi que me eximira de participar da comédia da vida, da qual eu sequer conhecia o prólogo. Sua presença me salvava do meu asco pela normalidade, Eu o amava de um amor sem passado, ou sequer futuro. E todas as horas que eu passava a seu lado possuíam a hesitação e a brevidade de um primeiro beijo, a ingênua fragrânciada primeira canção que fui capaz de cantar, com os lábios secos e o rosto transbordando de fé. Ele foi pra mim, e ainda o é, a própria imagem de um céu torto ou um paraíso desfeito. E veio a mim como um Deus destronado que exalava adoração apenas com o seu bater de cílios na pele tímida. E eu, cuja a resignação falhava, a cada tentativa de superá-lo, que fazia da sua ausência um pretexto para meus atos patéticos e tolos que no fundo, eu sabia, vinham da minha vulnerabilidade. Em mim, o amor passava como um sopro, uma vida que por medo esquecera de viver. Como todas as estórias de amor, a minha não duraria o tempo exato da queda de uma lágrima. Quando eu soube que uma chuva de maio não poderia durar eternamente, tampouco um verão, eu o deixei. Porque ele queria uma casa com lareira, crianças esperando a ceia e colocando sapatinhos na janela. Ele queria uma constelação com seu nome e um casamento num dia em Maio. Eu nunca quis nada... Nada além de acordar naquele embaraço de pernas e ouvir o seu bocejo, de beber os seus sorrisos até a embriaguez total, de contar os fios do seu cabelo até que ele me parasse. Eu que queria seu pasmo, seu ódio, sua irritação, não estava disposto a aceitar seu futuro tédio, porque com o meu eterno cansaço, nada poderia lhe oferecer que não fossem as mesmas promessas dúbias e vazias. Mas eu era egoísta o suficiente para dizer que tudo o que eu queria era ele, mas era também tudo o que eu não ousara ter. Então ele encontrou alguém que poderia lhe dar o que eu não poderia jamais. Hoje, ele tem tudo o que sempre quis. Eu nunca terei e isso não parece justo. De tudo, restou apenas o sopro e a canção.

Ps1 Texto anteriormente postado no meu antigo blog e num site de fanfics, como não ando escrevendo muita coisa pro blog, resolvi passar o material de lá pra cá, para os que não liam meus textos no outro endereço. That's all!

Um comentário:

  1. Consegui imaginar a cena se desenrolando. A forma como descreveu as cores e o cheiros tbm ficou bem legal

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