sexta-feira, 27 de maio de 2011
As Horas
"Always the love, always the hours..."
Passando a mão pela poeira dos dias que deixei acumulados na estante, percebo as horas que perdi. Percebo mais além, tudo o que devia ter feito e que só me ocorre agora, porque antes pareceria um pensamento desconexo. Já não tenho o que escrever e estou tao solitária nessa escassez de palavras que posso ouvir o ranger de portas pesadas dentro da minha cabeça e também os passos de alguém que não vai voltar.
-Tola! - Eles dizem e com razão.
Os que beberam do sereno santo jamais voltaram a ser pecadores.
- Acalma-te! " Essas paixões violentas tem fins violentos." - Não foi isso que o bardo escreveu?
Eu não sei... E quem sabe não seja justamente esse meu maior pecado? Para não dizer heresia: Não saber.
Queria tirar essa fina camada de pó dos meus dedos e voltar a enxergar em tons amenos, mas não posso, os dedos que se inflamam e pulsam ao toque não querem mais sentir. Os pelos que se eriçam ao contato com a superfície fria, não querem mais a dor. Eu escolhi andar cega entre os meus convivas. Todos eles, sem exceções, não podem me ver, embora eu tenha escolhido não vê-los. Um pouco dessa minha alma não confia mais nas borrascas, um pouco dessa minha alma almeja por violetas irreais, porque almejar por violetas é o martírio mais doce que Deus poderia conceber aos pecadores.
Eu não faço mais sentido dentro das horas. Eu não quero mais. E renegar a luta as vezes também é prova de coragem. Saber a hora de parar. Não se enganar com gestos repetidos, com aproximações falsas. Eu tenho medo de vacilar, de cair em contradições fatais e perder o próprio orgulho e o pó que me enoja persiste em grudar-se cada vez mais aos meus poros.
Eu não tenho medo da chuva, da raiva, da morte, e na pior circustância, não, querida. Eu não tenho medo de você. Mas eu tenho medo de mim. É eu que não sei trilhar os meus caminhos. É da minha sordidez e desumanidade que fujo e atravesso caminhos descarpados. É a minha incostância que temo. É perante o penhasco e a queda livre dentro em mim que emudeço.
Faltam-me palavras para descrever o que eu sinto, mas são meus silêncios que me decifram. Todas as musas de Apolo dançam nos meus olhos cegos. Eu temo a escassez, porque temo que não haja sentido em tudo isso. Existe sentido na piedade, Senhor Deus? Existe sentido na abnegação? Existe sentido no sofrimento excessivo e na extrema renúncia? Existe sentido no amor, Meu Deus? Eu não sei mais..
Os grilhões da perfeição que me acorrentam a mim mesma interditam os meus passos.Ninguém nunca retirará com sua caridade esses grilhões. Ninguém nunca conseguirá a façanha hércula de me tirar de mim. Tenho muito ciúmes de mim mesma e muita pena também.
Quisera abraçar ao colo infértil a criança que um dia fui. Que acreditava (e acredita) em estórias de Natal, que fica feliz com um pedaço de pano, um copo de suco e um abraço. Quisera dizer a ela que tudo vai ficar bem, que não existem lobos lá fora e que a chuva torrencial não dura eternamente. Quisera fazê-la acreditar e não esperar, porque esperar por cartas que não chegam, é deixar a poeira das horas acumular nas estantes.
Quisera apenas beijar suas bochechas rosadas e sardentas e sorrir. Um sorriso humano. Com dentes, espírito e vontade. Um sorriso de verdade, não um gesto repetido... pra quem sabe quantas pessoas por dia? Quisera que não houvessem farpas e dados viciados no caminho e que os lobos fugissem quando ouvissem seus passos. Quisera apenas não ser eu aquela menina, não ter sobre as costas o peso da cobardia e da fragilidade. Quisera ser livre para ser minha. Mas eu não posso. Essas reminiscências é o que sempre me traz a sua vinda. Por enquanto, só volte quando meu coração estiver completamente em paz.
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Me "vi" em algumas passagens desse teu texto, Alice. Está maravilhoso.
ResponderExcluirse essa perda de espaço, de si mesma, de palavra, resultar nisso, por favor, me ensina como se faz ):
ResponderExcluirVocê me espanta quando escreve praticamente um espelho.
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